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Foto do escritorÁbine Fernando Silva

Batem à Porta (2023) / Impressões

Direção: M. Night Shyamalan

Roteiro: M. Night Shyamalan

Elenco principal: Dave Bautista, Rupert Grint, Ben Aldridge, Jonathan Groff, Abby Quinn, Kristen Cui, Nikki Amuka-Bird.

Disponível: Telecine

Nikki Amuka-Bird, Dave Bautista, Abby Quinn e Rupert Grint são os 4 cavaleiros do apocalipse em "Batem à Porta"

“Batem à Porta” de M. Night Shyamalan parece extrair sua potência dramática da sutileza com que vai perscrutando e revelando a personalidade, o comportamento e as intenções dos seus personagens numa trama habilidosa em manipular suspense, tensão e ambiguidade, cujo imperativo moralizante (no sentido pedagógico do termo) opera como uma espécie de tentativa de “resgate” da fé, da crença no mito e de certos valores humanos da coletividade, talvez, um tanto “turvados” em meio a um caudal demasiado racional, dessacralizado, malicioso, intolerante e violento no qual o mundo moderno parece chafurdar. Particularmente me soa instigante e alentador essa inquietação de Shyamalan em lapidar sua estética e oxigenar seu cinema com um tipo de apelo mais místico e sensitivo, isto porque em “Batem à Porta” o diretor mesmo ao lançar mão de uma premissa realista e violenta (uma situação bizarra de invasão com reféns) e propor o embate entre crenças e visões de mundo irreconciliáveis, deixando margem para um tipo de ambiguidade que desafia o espectador, resolve, por fim, dar vazão a suas convicções fantásticas, apostando no viés instrutivo de parábola, sobretudo, através do esmero criativo em que comunica uma série de reações, sentimentos e emoções humanas advindos das relações e vínculos que se estabelecem entre os personagens. Ora, a forma estilizada como a câmera de Shyamalan evidencia a encenação como um todo criando certos “efeitos” e “distorções” de ângulo e foco, reforçando uma atmosfera “ameaçadora”, “estranha” e “misteriosa”; essa abordagem mais íntima dos invasores e da família que vai desnudando as personalidades, construindo contrastes e gerando tensão, especialmente, entre a figura imponente e instigante de Leonard (Dave Bautista), a pequena Wen (Kristen Cui) e seus pais Andrew (Ben Aldridge) e Eric (Jonathan Groff); a disposição de “pistas” discretas na mise-en-scene que se percebidas reforçam a semântica dos acontecimentos; a delicadeza na inserção dos flashbacks administrando o ritmo dos eventos e reconstituindo momentos que justificam os motivos do casal homo afetivo, assim como essa escolha bastante direta pela problemática do conflito, sem muitos rodeios, demarca a distinção estilística e criativa de uma narrativa claramente tributária à essência da mitologia cristã, muito embora, o valor puro e espiritual de sua mensagem de amor, confiança, esperança e sacrifício, de maneira sábia, renegue o dogma homofóbico. “Batem à Porta” parece captar, com efeito, essa disputa ideológica contemporânea em torno de uma tendência religiosa fanatizada, intolerante, conspiratória e superdimensionada na internet de um lado e do outro, uma perspectiva mais racional, científica, democrática e inclusiva, ambas representando espectros políticos em colisão, no entanto, essa rejeição do longa a uma solução realista convencional (toda aquela versão dos invasores como um delírio de seita), ainda que não seja nenhuma novidade na própria cinematografia de Shyamalan e consolide a substancia dos seus tão famigerados “plot twist” pode eventualmente gerar, em parte do espectador, uma leitura enviesada e insatisfatória da escolha devido ao seu teor simbólico e supostamente ideológico. A meu ver, esse arcabouço mítico cristão da mensagem não chega a torna-la restritiva ou tendenciosa, pois seu conteúdo adquire relevância universal e espiritual, preconizando a busca pela construção dos laços de confiança e aprendizado comunitários, a valorização da pureza e da tolerância, a superação do ódio e o sacrifício em nome do amor ao próximo. A sacada genial de M. Night Shyamalan aqui está justamente na orquestração insinuante, na ideia “do que aparenta ser” e “do que de fato é”, inclusive, no que se refere ao contorno paradoxal inerente à função da violência na trama, ora enquanto morte, ora enquanto vida, ora expiação e ora redenção.


Nota: (7,5 / 10)


Por: Ábine Fernando Silva

56 visualizações1 comentário

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1 Comment


Yara D'Orazio
Yara D'Orazio
Oct 18, 2023

Eu não sei explicar o misto de emoções que eu senti assistindo esse filme. Shyamalan sempre me traz experiências das quais eu nunca saio ilesa. Fantástico.

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