Direção: James McTeigue
Roteiro: Matthew Sand e J. Michael Straczynski
Elenco principal: Rain, Naomie Harris, Sho Kosugi, Rick Yune, Ben Miles, Kylie Liya Goldstein.
Segundo filme do australiano James McTeigue (diretor de “V de Vingança”, 2006), “Ninja Assassino” tenta se firmar explorando um nicho de filmes de artes marciais muito em voga nas décadas de 80 e 90, cujo forte clamor popular jamais significou, por outro lado, realizações de qualidade. Dificilmente é possível apontar um longa sobre “ninjas”, normalmente produções estereotipadas e de baixo orçamento, que realmente faça jus à importância histórica e mítica desses mercenários das sombras, ao contrário, por exemplo, das muitas versões extraordinárias e bem sucedidas de narrativas samurais, abundantes na tradição do cinema japonês (há de se considerar também a relevância do antagonismo e da função social dessas duas espécies de guerreiro ao longo da história do Japão). Em “Ninja Assassino”Mcteigue se esforça para dar identidade e estilizar a obra, contando com sua inestimável experiência como assistente de direção na trilogia “Matrix”, no entanto, as ótimas sequencias de ação e combates coreografados, utilizando uma ambientação sombria e efeitos estridentes de CGI (com exagero é claro), não são o suficiente para sustentar a trama que rapidamente ganha contornos genéricos e estereotipados, principalmente porque o roteiro fraco não dá conta de aprofundar os arcos, conferir coerência e dramaticidade aos seus conflitos, além do mais, o elenco principal entrega performances pouco inspiradas. A legista criminal da Europol na Alemanha Mika (Naomie Harris) investiga uma série de assassinatos políticos misteriosamente ligados a uma irmandade secreta de ninjas que recebem uma quantia vultosa para eliminar figurões importantes mundo afora. Enquanto isso, Raizo (Rain) um dos jovens guerreiros integrantes do clã rompe com seu líder Lorde Ozunu (Sho Kosugi), cansado da filosofia e métodos desumanos do mestre que ordenou a morte da doce Kiriko (Kylie Liya Goldstein), sua amada companheira de clã. Inicia-se uma caçada implacável da Ozunu contra o ninja dissidente que o coloca inevitavelmente no caminho de Mika, vigiada pelas autoridades da polícia contrariadas com as descobertas impertinentes da investigadora. Raizo pretende enfrentar seu destino, vingar-se de seu ex-líder e mentor fazendo justiça e para isto, conta com a ajuda destemida da policial que também havia se tornado alvo dos mercenários das sombras. O roteiro da dupla Matthew Sand e J. Michael Straczynski aposta numa trama devotada à ação violenta, aos confrontos corpo a corpo ou com uso de armas (katanas, kusarigama e shurikens), além de explorar por um tempo considerável o treinamento rígido, cruel e brutal experimentado por jovens que logo cedo são recrutados e transformados em assassinos frios e furtivos. Há uma insistência em atribuir ao clã Ozunu uma áurea existencial quase mística e sobrenatural, aspecto que de certa forma dialoga com a tradição histórica dos guerreiros das sombras, embora o filme de McTeigue seja muito econômico ao tratar a cultura do ninjutsu e pouco revele a respeito da gênese deste universo, abordado mais sob a ótica da perversidade e da vilania. “Ninja Assassino” progride desenvolvendo dois arcos narrativos concomitantes que inevitavelmente se cruzam, o do jovem ninja em fuga e o da investigação da policial da Europol, unidos para desmantelar o império criminoso dos mercenários.
O desenvolvimento dramático da narrativa é pífio, uma vez que o roteiro não consegue dar profundidade psicológica e emocional aos personagens, nem mesmo construir momentos interativos mais intensos com diálogos menos óbvios, o que mais ou menos ameaça ocorrer na relação proibida entre Raizo e Kiriko. Em se tratando da atuação dos protagonistas, Naomie Harris e Rain são sofríveis em tela, tamanha obviedade expressiva, dificuldade em manifestar reações emotivas e sinceras, fator prejudicado ainda mais pela já referida pobreza dos textos dos diálogos que só atrapalham os atores. “Ninja Assassino” carece às vezes de elementos que costurem de forma satisfatória sua própria história, já que não fica muito claro o que desencadeia a investigação de Mika e qual o nível de envolvimento da Europol com o clã Ozunu (soam como pontas soltas). Somam-se a isto, algumas conveniências e absurdos na trama que qualquer expectador um pouquinho mais exigente se incomoda como a rapidez com que a protagonista passa a confiar em Raizo, a condição quase sobre-humana do personagem vivido por Rain, muito superior aos seus adversários em praticamente tudo, o espírito de concorrência clichê do ninja Takeshi (Rick Yune) motivado pela inveja, aquela invasão final exagerada de um exército de policiais no esconderijo do clã Ozunu e a espécie de atitude forçadamente destemida da policial que se coloca em perigo, brotando do nada e na hora certa para ajudar seu novo amigo. A direção do australiano imprime uma atmosfera sombria, metafísica e letal ao retratar o clã Ozunu, articulando uma cinematografia que explora de forma oportuna cenários pouco iluminados, efeitos de sombras estilosos, uma fotografia escura que realça o impacto de cores fortes como o vermelho e o dourado, além de abusar de planos abertos que captam com precisão a ação, os movimentos dos corpos, os saltos e as lutas rápidas, limpas, vibrantes e bem coreografadas. A plasticidade dos golpes com espadas e kusarigamas, assim como as trajetórias vertiginosas dos shurikens são muito bem captadas e calibradas por um slow motion empolgante, sendo suavemente manipulados por uma CGI discreta e impactante, cujo efeito realista se desgasta pela escolha exagerada do goore, onde litros e litros de sangue jorram das feridas e dos membros decepados. James McTeigue não economiza na retratação da violência que embora possua impacto estilístico e visual, acaba se tornando banal e vulgarizada pela recorrência. A montagem do filme é dinâmica e eficiente ao dar conta de equilibrar o passado de Raizo por meio de flashbacks, sem perder de vista o presente do herói e também o arco da investigação de Mika, funcionando bem no sentido de preparar a narrativa para atender aos interesses da ação. “Ninja Assassino” é um bom filme de artes marciais, despretensioso como passatempo, medíocre do ponto de vista dramático, mas vibrante e imersivo em sua proposta de ação ultraviolenta e em sua estética ninja sinistra.
Por: Ábine Fernando Silva