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Foto do escritorÁbine Fernando Silva

O Mal que nos Habita (2023) - Impressões

Atualizado: 18 de jul.

Direção: Demián Rugna

Roteiro: Demián Rugna

Elenco principal: Ezequiel Rodríguez, Demián Salomón, Silvina Sabater, Luis Ziembrowski, Marcelo Michinaux, Emilio Vodanovich, Paula Rubinsztein.

Disponível: Netflix

Cartaz de "O Mal que no Habita" do diretor argentino Demián Rugna

“O Mal que nos Habita” de Demian Rugna aborda os impactos de uma espécie de maldição demoníaca sobre uma pacata comunidade no interior da Argentina a partir das peripécias dos irmãos Pedro (Ezequiel Rodríguez) e Jimi (Demián Salomón), dois proprietários rurais que após encontrarem parte de um corpo mutilado em terras vizinhas, acabam descobrindo uma inusitada conexão entre esse hediondo crime e a família de Uriel (Pablo Galarza), um enfermo acamado, coberto por uma infecção purulenta e possuído por uma entidade maligna prestes a renascer. Rugna parece evocar, através desse mote sobrenatural, toda uma problemática social ligada às relações entre os indivíduos e instituições naquele inóspito vilarejo que discretamente vai revelando certo descaso governamental na região e a prevalência do poder autoritário dos fazendeiros que não medem esforços para preservarem, acima de tudo, seus interesses particulares. Essa premissa fantástica que se apresenta logo de cara envolvendo os irmãos num turbilhão tenso e vertiginoso chega a produzir bastante desconforto e estranheza no espectador, uma vez que a própria trama rejeita pelo menos a princípio, quaisquer especulações mais racionais ou atitudes céticas dos personagens que tentem justificar os fenômenos bizarros e as mortes que de repente se sucedem. Nesse sentido, o roteiro aposta numa dinâmica dramática bem intensa que vai gradativamente abandonando a ideia de ambiguidade e paranoia que até então se impõe com força, sem, por outro lado, abdicar da pegada mais alegórica que prescinde do terror. Essa aceitação naturalizada da existência de um "possuído" e o medo de seus efeitos nocivos imediatos na comunidade mobilizam, para além de uma série de conflitos angustiantes e traumas, uma percepção bem peculiar sobre os valores, a visão de mundo daquele grupo social e, sobretudo, a forma como tentam lidar com a problemática da possessão. Ora, todo esse clima de abandono institucional e a tentativa egoísta e arbitrária dos fazendeiros em se livrar de Uriel, à medida que potencializam a dimensão da tragédia e da desgraça instauram também, agora num plano mais metafórico, uma perspectiva de desesperança meio generalizada e o esgarçamento dos laços sociais frente à ameaça disseminada, o que fica evidente se consideramos as escolhas equivocadas e individualistas dos protagonistas, ignorando, inclusive, certas regras imprescindíveis para combater a maldição. É como se pudéssemos traçar aqui uma analogia bem pertinente entre a crise econômica e social vivida pela Argentina há alguns anos (como uma espécie de maldição) e as dificuldades da própria sociedade e das instituições em enfrentá-la recorrendo a alternativas mais solidárias e humanas. Tudo parece se esfarelar diante da iminência desse mal que encontra terreno fértil na estupidez e no individualismo dos personagens. “O Mal que nos Habita” ostenta com bastante desenvoltura e naturalidade certo virtuosismo de estilo ao articular diversas tradições do terror (psicológico, sobrenatural, goore, etc.) perseguindo, contudo, através de uma escalada súbita da violência gráfica e chocante, àquela sensação de repulsa e perplexidade. Demián Rugna consegue manipular nossas expectativas sempre criando tensão, explorando a instabilidade psicológica dos personagens e a intensidade do drama sem que com isso sua concepção de terror se esgote nas exigências da “verossimilhança” ou de uma lógica mais realista das circunstancias. Ao contrário, o que soa como inconsistência na trama, me parece muito mais uma escolha lúcida do diretor argentino que alimenta, no fim das contas, um tipo de horror acachapante e brutal que ratifica a impotência humana diante de um mal que acaba prevalecendo e contaminando tudo.


Nota: 7 / 10


Por: Ábine Fernando Silva

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