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Foto do escritorÁbine Fernando Silva

Onde Fica a Casa do Meu Amigo? (1987)/Impressões

Atualizado: 11 de jan.

Direção: Abbas Kiarostami

Roteiro: Abbas Kiarostami

Elenco principal: Babek Ahmed Poor, Ahmed Ahmed Poor, Kheda Barech Defai, Iran Outari, Ait Ansari, Sadika Taohidi, Biman Mouafi, Ali Djamali, Aziz Babai, Nader Ghoulami, Akbar Mouradi.

Disponível: Globo Play

Babek Ahmed Poor (Ahmed) em "Onde Fica a Casa do Meu Amigo?" de Abbas Kiarostami

Primeira obra que compõe a “Trilogia Koker” (nome do vilarejo onde os enredos foram filmados), “Onde Fica a Casa do Meu Amigo?”, 1987 de Abbas Kiarostami narra os dissabores de Ahmed (Babek Ahmed Poor), um garoto de oito anos que após levar pra casa por engano o caderno do seu coleguinha de classe, ameaçado de expulsão pelo professor caso não realizasse a tarefa do dia, parte numa verdadeira “corrida” contra o tempo para encontrar a casa de Mohammad (Ahmed Ahmed Poor) e evitar o pior. O longa de Kiarostami propõe de forma bem direta uma espécie de “jornada épica” do cotidiano ou “odisseia da casualidade”, forjando no centro da sua representação um acontecimento aparentemente banal e pueril, mas que, por sua vez, engendra o ato puro e virtuoso de grandes proporções dramáticas, haja vista que o ímpeto obstinado e leal de Ahmed “esbarra” numa série de frustrações e obstáculos, advindos, sobretudo, de um “universo” adulto assaz intransigente, disciplinador e pouco atento a certas necessidades infantis. Aliás, sobre isso, a trama deixa entrever, ainda que discretamente, como são travadas determinadas relações sociais no seio daquela aldeia iraniana, onde o respeito à autoridade rígida, a obediência um tanto cega aos mais velhos e o trabalho infantil cooperativo parecem naturalizados, assim como a consciência do dever comunitário, das responsabilidades familiares e o artifício de uma comunicação tensa e impositiva manifestam-se como via de regra. A proposta simples e direta do roteiro não esconde seu caráter sensível e profundo ao retratar essa pureza de princípios encarnada pelo protagonista, cujo senso de solidariedade, sacrifício e justiça, lança-o numa empreitada desafiadora e que pouco a pouco vai ganhando contornos meio pessimistas e angustiantes. Devolver o caderno ao amigo e evitar uma punição severa que também imputaria ao herói mirim sua parcela de culpa torna toda a ação do filme digno dos grandes gestos de humanidade, muitas vezes, escondido bem ali no “turbilhão” da vida ordinária, como uma pérola valiosíssima que se ofusca sob o singelo casco de uma concha. A linguagem minimalista do diretor iraniano articula uma abordagem realista bastante crua e com uma pegada documental, aproveitando cenários reais, atores não profissionais e situações aparentemente espontâneas, o que remete mais diretamente à estética do Neorrealismo Italiano. No entanto, toda essa encenação natural traduzida numa decupagem até bem tradicional (planos abertos e fixos, pouca variação de ângulos, edição contida) preconiza o ponto de vista de Ahmed e sua nobre missão, criando uma série relações dramáticas intensas que transbordam sensibilidade e expressividade poética. “Onde Fica a Casa do Meu Amigo?” cativa e emociona pelo singelo que comunica o sublime, provando que o grande cinema também se faz pelos modestos recursos.


Nota: 9,5 / 10


Por: Ábine Fernando Silva

 

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