top of page
  • Foto do escritorÁbine Fernando Silva

Os Três Dias do Condor (1975)

Direção: Sidney Pollack

Roteiro: David Rayfiel e Lorenzo Semple Jr.

Elenco principal: Robert Redford, Faye Dunaway, Cliff Robertson, Max von Sydow, John Houseman, Addison Powell.


Trama de espionagem baseada no romance homônimo de James Grady, “Os Três Dias do Condor” de Sidney Pollack aproveita o contexto histórico e político dos anos de 1970, auge da Guerra Fria, do escândalo de Watergate e da Guerra do Vietnã para desenvolver um thriller investigativo e cerebral que revela uma das funções mais polemicas da CIA, apontando para os jogos de poder e interesses dentro da agencia americana. A obra de Pollack chama a atenção para a sutileza camuflada do tráfico de informações estratégicas que desestabilizam governos e economias, superestima e questiona o papel da imprensa em relação aos crimes e a ilegalidade das ações do Estado, além de articular com eficiência o clima opressivo de paranoia, inerente ao próprio enredo e a contexto da época, com um drama romântico irreconciliável, espécie de desafogo narrativo. Um grupo de agentes disfarçados que trabalham para CIA num escritório de fachada no coração de Nova York, analisando produções escritas de diversos gêneros, são sumariamente executados de surpresa por um grupo armado. Por um lance de sorte, Joseph Turner (Robert Redford), um dos agentes analistas havia se ausentado pelos fundos do prédio momentos antes do ataque. Ao constatar o terrível episódio, Tuner, codinome Condor, apreensivo e acuado contata imediatamente seus superiores, tentando compreender o que acontecera. Suspeitando das intenções e informações duvidosas destes mesmos mandachuvas do comando, Condor passa a empreender uma investigação particular ardilosa, chegando a evidencias que o colocam como o principal alvo das queimas de arquivo realizadas. Escondendo-se de G. Joubert (Max von Sydow), o periculoso matador recrutado por um figurão influente da própria agencia de espionagem, cujos interesses escusos acabam descobertos, o protagonista na tentativa de se safar acaba se envolvendo amorosamente com Kathy Hale (Faye Dunaway), uma solitária fotógrafa a quem sequestra durante a fuga. O roteiro da dupla David Rayfiel e Lorenzo Semple Jr. desenvolve uma trama de espionagem cerebral não entregando os principais motivos gratuitamente, priorizando a jornada detetivesca de Turner que aos poucos vai revelando fatos importantes que justificam as intrigas do enredo. O arco que acompanha as ações da cúpula da CIA e suas providencias em lidar com o atentado ao grupo de Condor é carregado de ambiguidade e incerteza em relação aos verdadeiros envolvidos e aos interesses em jogo, principalmente no que se refere ao papel do mercenário Joubert, cujo recrutamento, subordinação e reais intenções deixam o espectador com aquela pulga atrás da orelha. Além disso, o caráter complexo, enigmático, calculista e sarcástico do assassino que acaba mudando de lado de acordo com as conveniências e recompensas torna a história ainda mais atraente, imprevisível e impactante. A reflexão acerca do papel da CIA e sua conduta sorrateira e inescrupulosa aparecem em “Os Três Dias do Condor” revelando a organicidade social da instituição, sua influencia tentacular principalmente no campo das atividades culturais consideradas nocivas para os interesses dos Estados Unidos mundo a fora.

Há uma série de intrigas e jogos de poder entre membros importantes da famosa agencia que interferem diretamente na realidade político-social de diversos países, escancarando o aspecto ilegal e criminoso da espionagem, atividade que o escritório de Turner realizava e que de forma aparentemente ingênua não ponderava a respeito de suas consequências antiéticas devastadoras, o que soa um tanto inverossímil. Desta forma, a “queima de arquivo” aparece como tentativa de “jogar panos quentes” e abafar “vazamentos” e “escândalos” que colocariam em xeque a lisura e credibilidade da instituição frente a sociedade, argumento fictício que encontra ressonância na vida real, haja vista a repercussão do caso Edward Snowden em 2013, o analista de sistemas da CIA responsável por tornar público os vários mecanismos de vigilância e controle do governo estadunidense a nível global. Por outro lado, a crença do desertor no poder de uma imprensa autônoma e democrática que traria à tona toda a sujeira no âmago do órgão do governo, encontra na ameaça chantagista de J. Higgins (Cliff Robertson), pertencente ao alto comando, a mais dura verdade em relação à onipotência do sistema em preservar seus esquemas e interesses, algo que a batalha individual de um homem seria incapaz de fazer frente. De maneira geral, a narrativa disfarça com eficácia o principal conflito da trama, inclusive a função do protagonista, entregando seus motivos no compasso das ações e elucubrações de Condor, o especialista em telecomunicações, sempre um passo a frente de seus perseguidores e que no fim das contas é o grande alvo de Leonard Atwood (Addison Powell), integrante do auto escalão da CIA que mantém negócios escusos com o petróleo, no Oriente Médio e na Venezuela, informações acidentalmente descobertas pela perspicácia analítica do espião. A paranoia que põe sob suspeita tudo e todos, sentimento bastante comum no auge da Guerra Fria dita os passos do herói e suas peripécias investigativas, não obstante, as tentativas de apagar o próprio rastro e a busca pela verdade, levam-no a um romance improvável com a personagem de Faye Dunaway, desafogo dramático oportuno, meandro narrativo que explora um pouco mais da personalidade de um sujeito intelectualizado, cujas exigências de uma atividade secreta o conduziram a uma vida solitária de raros laços sociais e afetivos. Embora “Os Três Dias do Condor” apresente uma trama de espionagem mais cerebral, investindo muito pouco na ação ou nos confrontos corporais e a bala (lembrando que o protagonista não é um agente de campo), algumas conveniências de roteiro alimentam a excepcionalidade do espião, algo a la James Bond ou Jack Ryan, fazendo com que Turner transite por lugares estratégicos sem levantar suspeitas ou acesse certos mecanismos sem nenhuma proteção. A direção de Sindey Pollack constrói bem a atmosfera de incerteza e imprevisibilidade, interessando-se pelos personagens e suas motivações que jamais são reveladas de antemão. A decupagem cumpre bem a proposta do suspense, fornecendo através da sutileza dramática dos gestos dos personagens, de suas reações e de alguns elementos de cenários, informações que podem ajudar o espectador a montar o quebra-cabeça de algumas situações. A trilha de jazz aufere certo tom pessimista e melancólico ao filme, evidenciado também pelo drama romântico entre Kathy e seu “sequestrador”, relação tácita, intensa, inesperada e fugaz, registrada por uma câmera sensível, intimista e em certos momentos até poética, mesmo levando em consideração o absurdo de uma situação clara de coação física e psicológica (parece acontecer aqui a famosa síndrome de Estocolmo). A montagem fluída da narrativa envolve e instiga o espectador, uma vez que o ritmo imprimido equilibra com satisfação as peripécias do agente em fuga e as ações da alta hierarquia da CIA, intercalando sutilmente os eventos e revelando-os na medida certa. Robert Redford ostenta o charme e a presença do agente secreto alimentada pela tradição cinematográfica, embora a função de seu personagem se restrinja à inteligência e a capacidade de erudição (fator que o personagem não transmite com eficiência). Faye Dunaway se destaca num papel discreto, porém, de forte apelo melodramático ao viver a vítima que se envolve com seu agressor. Há um misto de carência, resistência e fascínio por Turner muito convincente, ainda que a ligação sentimental de ambos aconteça rápido demais. Vale mencionar a circunspecção meticulosa, a sagacidade e a complexidade psicológica que Max von Sydow empresta a G. Joubert. O mercenário aparece pouco, porém, o suficiente para intrigar e surpreender o expectador. Por último, Cliff Robertson comunica com precisão a ambiguidade das suas intenções na pele do influente burocrata da CIA, responsável pelas operações de Condor. A dissimulação do personagem dificulta a identificação de suas reais intenções em relação ao destino do protagonista, por outro lado, sua lealdade maquiavélica ao órgão de inteligência dos Estados Unidos transforma-o em vilão incontestável. “Os Três Dias do Condor” integra uma tradição de thrillers investigativos bastante em voga nos anos de 1970, influenciados diretamente pelo contexto paranoico da Guerra Fria e do escândalo de Watergate. Da mesma forma que “A Conversação” 1974 de Francis Ford Coppola e “Todos os Homens do Presidente”, 1976 de Alan J. Pakula o filme de Sidney Pollack parece traduzir fielmente a mentalidade paranoica de uma época, sem contudo, perder o eco histórico e a relevância atual de seus temas.


Por: Ábine Fernando Silva

111 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Commentaires


Título 1

bottom of page