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  • Foto do escritorÁbine Fernando Silva

Parasita (2019) /Impressões

Atualizado: 27 de set. de 2023

Direção: Bong Joon-ho

Roteiro: Bong Joon-ho e Han Jin-won

Elenco principal: Song Kang-ho, Jang Hye-jin, Choi Woo-shik, Park So-dam, Lee Sun-kyun, Cho Yeo-jeong, Jung Ji-so, Jung Hyun-joon, Park Myung-hoon, Lee Jung-eun.

Disponível: HBO Max

Choi Woo-shik, Song Kang-ho, Jang Hye-jin e Park So-dam contracenam em "Parasita" de Bong Joon-ho

“Parasita” de Bong Joon Ho desenvolve gradativamente por meio do humor ácido e do sarcasmo uma espécie de “sutileza tensa” das relações sociais entre a pobre família Kim e a abastada família Park que naturalmente se esgarça num conflito de classe mais explícito, cujas consequências trágicas inadvertidas tendem a problematizar o caráter anteriormente estereotipado da representação embusteira dos Kim, lançando luz sobre suas possíveis escolhas ético-morais, talvez, um tanto sujeitas a essa condição social indigna e degradante. Por outro lado, num movimento aproximativo de lupa, a trama evidencia a arrogância elitista e o frágil vínculo íntimo dos “patrões” com os “empregados”, estes facilmente descartáveis e substituíveis dentro de uma concepção de classe indiferente e puramente utilitária que se retroalimenta (ou parasita) do potencial de “reserva de mão de obra barata”. Bong Joon Ho propõe, de maneira geral, um tipo de realismo bastante sofisticado equilibrando uma abordagem estilística mais tradicional e formal com uma mais moderna e discreta que absorve uma série de detalhes sugestivos da encenação como um todo, seja quando o foco são os pobres "entulhados" num ambiente insalubre (literalmente como insetos) naturalizando um “ethos” de quadrilha através de um “pacto” imoral consentido e estimulante, seja quando as atenções se voltam aos privilegiados burgueses em sua habitação ostentosa e imponente, cuja ignorância em relação aos sucessivos “golpes” sofridos não são suficientes para os definirem, no fim das contas, como “meras vítimas” ou supostos “hospedeiros indefesos”. O diretor sul-coreano consegue despretensiosamente por meio da comédia cáustica e da representação estereotipada açambarcar a desigualdade social e a luta pela sobrevivência convidando o espectador a se tornar “testemunha” de indivíduos “ardilosos” de um lado e aparentemente “ingênuos” do outro, estabelecendo também para isto, uma série de conexões semânticas sutis com os espaços físicos e alguns objetos do design de produção que remetem a certas circunstâncias de classe, a aspectos específicos da personalidade coletiva, assim como conferem contornos sugestivos mais ambíguos a metáfora do “parasita” que também pode ser entendida num movimento oposto, dos patrões para com os empregados. Nesse sentido, é interessante como o roteiro e a própria direção assumem primeiro, uma nuance testemunhal menos íntima e conivente com os irmãos Ki-Woo (Choi Woo-shik), Ki-jung (Park So-dam) e seus pais Kim Ki-taek (Song Kang-ho) e Chung-Sook (Jang Hye-jin), caracterizados por um oportunismo golpista diante das oportunidades, para depois inverter inesperadamente essa pegada farsesca em um drama trágico, aproximando-se agora de maneira cautelosa dos sofrimentos e obstáculos experimentados pelos mais vulneráveis, reféns das mazelas sociais e das privações materiais (a figura cavernosa de Geun-sae interpretado por Park Myung-hoon sintetiza bem isso). Se a dificuldade empática com a família Kim e seu aliciante modus operandi se efetua por meio da manipulação habilidosa e discreta das lentes de Bong Joon Ho, essa inversão dramática disposta no “plot twist” da segunda metade do longa chega nesse momento a desafiar o distanciamento moral do espectador e seus prejulgamentos, sobretudo, à medida em que escancara de vez o efeito humilhante e deplorável da marginalização social e do imobilismo de classe na Coréia do Sul, ressaltando distinções e preconceitos elitistas, revelando a falência do estado de bem estar social e retratando o drama e os tormentos da ocupação urbana desenfreada em áreas de risco. Por outro lado, a dimensão trágica que o filme abruptamente assume, principalmente porque coloca os Kim diante de caros dilemas morais, empurrando-os para o caos da violência extrema, inclusive, contra seus próprios “irmãos de classe” numa “ida sem volta”, parece não rejeitar sua abordagem indiferente e até cínica daquela realidade, mesmo sob a “roupagem” mais sombria e nefasta, prevalecendo, ao final, um pessimismo meio difuso, desesperançoso e sarcástico por tudo. “Parasita” sintetiza muito da qualidade e da ousadia estilística e temática do cinema sul-coreano dos últimos anos, muito embora, seu olhar acerca das estruturas sociais e das relações de classe na Coréia do Sul possam insinuar a descrença e o distanciamento político irônico e generalizado.


Por: Ábine Fernando Silva


Nota: (9,5 / 10)

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